sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

1.75



Para André Dib, Geraldo Miranda, Filipe Bezerra e A. Fontenelle


Tenho um amigo que tem 1.97 de altura. Ele não é só alto, é largo, chama a atenção por onde passa. Além de tudo, é um cara doce e super inteligente, apaixonado pelas moças com quem namora e devotado demais ao sentimento por elas. Afora a inteligência e a simpatia, que lhe marcam, a altura, esse gigantismo em terra de pequenos, já foi (ou é, não sei mais) problema para ele, como no caso dos ônibus municipais, que ele ficava apertado entre um assento e outro, ou das portas cujos pórticos sempre eram baixos demais, ou certos carros em que ele, quase literalmente, ficava entalado, ou dos tênis de número 45 ( ou seria 46?) ou dos colchões tamanho especial.Vendo-o nessas situações, ou ouvindo seus relatos, tentava entender como é ser alto demais num mundo de estaturas médias. Eu só conheço o outro lado, o dos que são altos para serem baixos e os que são baixos demais para serem altos.

Fui ver um dos 5 shows de Madonna em dezembro, em São Paulo. Por mais que ao afirmar isso soe afetado, não tem nada tão forte quanto imaginar o valor simbólico de ir a um show muito produzido de alguém que, de fato, é um ícone vivo daquilo que representa. Isso, e só por isso mesmo, pode dar um sentido ao fato de se ir a um show como esse, porque se se leva em conta que, depois de tanta confusão para se conseguir ingressos tão caros, havia tickets por 10 00 na porta do estádio, é de se repensar o porquê de tantos atropelos e confusões. Ou seja, sábio é quem espera ou quem sabe esperar.

Ter visto esse show pode ter valido mais do que se eu estivesse mais integrado ou, num dizer mais direto, aterrissado lá, no gramado protegido do estádio do Morumbi. Depois de esperar em pé por tantas horas, acho que seis, e ainda estar meio out de tudo o que havia em volta (estou cada vez mais fora do ar, mesmo) só acordei para o show lá pelos 30 minutos iniciais. Me chamaram a atenção a referência aos anos 80 com ela pulando corda e de bermuda e quando, em She’s not me, ela desconstrói cada uma das madonnas que estão lá, cada uma representando uma fase, uma face, uma época, um signo. Semiótica pura: o ícone destruindo seus símbolos ali, a olhos vistos. Mais pós-moderno, impossível, e, paradoxalmente, muito verdadeiro por mostrar que ela mesma sabe o quanto nada é real ou nada é tão verdadeiro. Fiquei pensando nisso por um bom tempo.

Madonna é inteligente e se não fosse, ganharia minha admiração só por essa sacada sobre si mesma e o que ela é (ou não) para as pessoas.

Mas foi no show de Madonna que eu também me percebi como pequeno, baixinho, quase nada. À minha frente, um mar de cabeças e, como se elas não bastassem, as cabeças, havia ainda os braços levantados, inúmeros, com câmeras digitais na mão. Não contente em só fotografar (se eu tivesse tido a coragem de levar minha máquina, fotografaria também), as pessoas resolveram filmar o show. Ou seja: sem chance para os semi-altos de 1.75 como eu assistirem ao show sem ficar na ponta dos pés.

É daí que lembro de meu amigo, alto, muitas vezes em situações embaraçosas por ocupar tanto espaço e eu, ali, enquanto Madonna saracoteava, desejando também entalar em carros, bater a cabeça em tetos de ônibus e dormir atravessado em colchões pequenos para mim. Tudo para ter, ali, 1.97.


Um comentário:

filipe disse...

ah, afonso, mas pra você ficar maior só lhe basta uma perna de pau ou um salto plataforma. duvido é que muitos altões ali consigam ser com facilidade assim do tamanho que você é.

um beijo, te amo.